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José Luiz Ribeiro é consagrado imortal da Academia Brasileira de Cultura

Fonte e foto: ufjf notícias

No ano em que completa 60 anos de dedicação à arte teatral, o professor aposentado da Faculdade de Comunicação (Facom) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e coordenador do Grupo Divulgação (GD), José Luiz Ribeiro, toma posse na Academia Brasileira de Cultura. A cerimônia será realizada no dia 14 de novembro, na sede da instituição, localizada no Rio de Janeiro. Ribeiro ocupará a cadeira de número 53, cujo patrono é o poeta juiz-forano Murilo Mendes (1901-1975).

O mais novo imortal atendeu a Diretoria de Imagem Institucional em uma manhã de sábado no Forum da Cultura da UFJF, que abriga o Grupo Divulgação desde que o espaço foi inaugurado, em 1972. Em meio à dinâmica dos trabalhos, José Luiz contou o que sentiu ao receber a notícia do convite para a Academia. “Espanto. Eu jamais esperaria, porque os que estão lá estão na grande mídia carioca – um tambor que é escutado”, afirma o diretor, escritor, ator, cenógrafo, professor e jornalista.

Na cerimônia da próxima terça também tomarão posse a atriz Glória Pires, o autor Walcyr Carrasco, as cantoras Alcione e Liniker, as ministras Margareth Menezes (da Cultura) e Sônia Guajajara (dos Povos Indígenas), entre outros nomes atuantes no teatro, no cinema, na televisão, na música e demais setores culturais.

Uma vida dedicada à cultura de Juiz de Fora

Márcia Falabella e José Luiz Ribeiro em cena, 2019 (Foto: Gustavo Tempone)

Na avaliação da diretora do Forum da Cultura da UFJF, Marise Mendes, a “brilhante trajetória” de José Luiz culmina com a indicação para a Academia. “Há 57 anos, ele fez opção pela sua aldeia, apesar de ter sido convidado para inúmeros projetos de grandes centros. Não à toa, o Grupo Divulgação – que atua no Forum da Cultura desde 1972, juntamente com outras entidades, a convite do então reitor Gílson Salomão – foi reconhecido como patrimônio imaterial de Juiz de Fora em 2019”, destaca.

Para a atriz, coordenadora dos projetos de extensão do GD e professora da Facom, Márcia Falabella, a indicação de José Luiz Ribeiro para a Academia Brasileira de Cultura coroa a trajetória do teatrólogo e chama atenção por destacar o percurso de um artista que não atua no eixo central de produção cultural no país.

“Nós estamos na periferia. E penso que o Zé Luiz é muito merecedor: ele produz com um pensamento voltado para a comunidade e construiu um legado que pouco se conhece neste país. Para nós do Grupo Divulgação e, para mim em especial, que fui aluna dele e estou no Divulgação há 37 anos, é um momento de grande emoção”, avalia a docente.

Entre jornais e o teatro nos anos de chumbo

Filho de imigrantes portugueses, José Luiz Ribeiro nasceu em Juiz de Fora em 1942. Em 1965, ingressa no curso de Jornalismo na antiga Faculdade de Filosofia e Letras (Fafile). Ainda nos anos 1960, faz estágio na sede do Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro. É também nessa década que a trajetória teatral de José Luiz tem início, em um tempo de grande efervescência cultural e endurecimento gradativo da repressão política iniciada com o golpe militar em 1964, que culmina no Ato Institucional nº 5 (AI-5), instaurado em dezembro de 1968.

Neste contexto, o marco inicial da carreira teatral de José Luiz se dá em 15 de novembro de 1963, com o espetáculo “Brasil, espaço 63”. Com apenas 21 anos, o diretor conduziu um grupo formado por mais de 100 atores: havia música, dança e trechos da Divina Comédia, de Dante Alighieri. Um ano inteiro de ensaios para duas apresentações, no Teatro da Casa d’Itália. “Trabalhei com um grupo de operários da Industrial Mineira, que tinham um grupo de teatro, alunas que faziam as danças. Uma coisa muito louca”, define. No ano seguinte, é encenada, também na Casa d’Itália, “Sinfonia de uma favela”, peça criada e dirigida por José Luiz.

Durante a peça “Diário de um Louco”, que sofreu censura da ditadura em 1969 (Foto: Divulgação)

Para ajudar nas despesas domésticas, José Luiz passa a trabalhar no antigo Rocha Hotel, localizado na rua Marechal Deodoro, no Centro de Juiz de Fora. A jornada exaustiva o faz interromper os estudos. “Das oito às oito, eu tive que interromper. Fui office boy, carregava mala, abria elevador”. No ano seguinte, ele passa a trabalhar na Casas Regente, um armarinho. “Como saía às 18h30, consegui retomar minhas aulas às 19h e concluir o segundo grau.”

Já na faculdade de Jornalismo, começa o contato com o Teatro Universitário. Como ator, José Luiz faz “Romanceiro da Inconfidência”, de Cecília Meirelles (com direção de Nilo Batista, posteriormente governador do Rio de Janeiro) e dirige “O Coronel de Macambira”, de Joaquim Cardozo. Nessa época, a Fafile passava por uma grande modernização, após a chegada de Murílio Hingel (1933-2023) à direção da unidade. Ainda na graduação, José Luiz foi presidente do Diretório Acadêmico Tristão de Athayde, hoje Diretório Acadêmico Vladimir Herzog.

É nesse período de ebulição que José Luiz, junto com outros colegas de faculdade (dentre os quais se inclui sua futura esposa, Malu Ribeiro, também professora aposentada da UFJF), cria, em 1966, o Centro de Estudos Teatrais. Ali estava formada a gênese do Grupo Divulgação.

“Começamos a nos reunir aos sábados, porque pensávamos que, para ser jornalista, tinha que ter uma cultura geral. Todo sábado nós líamos uma peça. A faculdade tinha muitas semanas e descobriram que eu gostava de teatro. Assim, comecei a fazer espetáculos sob encomenda: sobre Carlos Drummond de Andrade, sobre Camões.”

O ponto de partida do Divulgação se dá em 7 de julho de 1966, com o espetáculo “Amor em verso e canção”, apresentado na Semana do Laticinista do Instituto Cândido Tostes. Assim como outras peças desse período inicial do grupo, essa é uma antologia de poemas e canções de diversos autores.

José Luiz Ribeiro em montagem da peça Calígula, em 1976 (Foto: Divulgação)

Ao mesmo tempo, José Luiz também desbravava os caminhos do Jornalismo. Após se formar, vai fazer estágio no Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro. De volta a Juiz de Fora, é contratado como diagramador no Diário Mercantil, então o periódico local de maior tradição. Responsável pela reforma gráfica do jornal, cria a Página de Cultura – que derivará no Segundo Caderno.

A repressão se fazia presente: o Divulgação apresentou espetáculos na presença de censores e teve uma montagem proibida no dia da estreia. O ano era 1969, o texto era “Diário de um Louco”, do russo Nikolai Gogol, com direção de Malu Ribeiro. Posteriormente, a peça foi liberada, porém não sem antes sofrer vários cortes. Nos trechos proibidos, José Luiz, que interpretava o protagonista, usava um lenço branco para tapar a boca. O silêncio valia mais que mil palavras.

No Diário Mercantil, as proibições também existiam.“Eu peguei a época do censor da Polícia Federal chegando na redação. A página estava toda desenhada, o cara dizia: ‘Essa notícia não pode’. Então tinha que tirar, refazer”, conta.

Era dos festivais

Outra etapa da cultura de Juiz de Fora acompanhada de perto por José Luiz Ribeiro foi a realização dos Festivais de Música Popular na cidade, entre 1968 e 1973. Criados na gestão de Itamar Franco na Prefeitura de Juiz de Fora, os eventos movimentaram a cena cultural local e proporcionaram a visita de artistas reconhecidos nacionalmente.

Peça “O rei da vela”, em 1982 (Foto: Divulgação)

Entre os participantes dos festivais de música na cidade estão artistas como João Nogueira, Alaíde Costa, Milton Nascimento e Clara Nunes, que concorreu em 1972 com o samba “Tristeza pé no chão”, clássico da música brasileira, de autoria do compositor juiz-forano Armando Fernandes Aguiar, o Mamão. José Luiz acompanhou a organização de cada um daqueles concursos, enquanto diretor do Departamento de Cultura e Promoções da Prefeitura. Também nessa posição, promoveu a primeira reforma do Museu Mariano Procópio, na década de 1970.

“Nós trabalhávamos muito. Murílio Hingel, que era secretário de Educação e Cultura, dava corda para papagaio subir”, afirma José Luiz, que também recorda as passagens dos artistas no Bar Chanan, na Avenida Getúlio Vargas. “Lá tinha o violão da Sueli Costa, o violão do Caetano. As pessoas iam, Caetano Veloso esteve lá, o Sidney Miller. O próprio Mamão era garçom do Chanan”, lembra.

Forum da Cultura e Extensão Universitária

Em 1971, a Faculdade de Direito, que funcionava em um casarão na rua Santo Antônio, centro de Juiz de Fora, estava de mudança para o campus universitário, localizado no bairro São Pedro. José Luiz propõe ao então reitor da UFJF, Gílson Salomão, adaptar o anfiteatro da faculdade para um teatro e transformar a antiga casa em um ponto de cultura: proposta aceita, nasce o Forum da Cultura da UFJF, inaugurado em 1972.

É nesse espaço que a companhia teatral passa a fazer Extensão Universitária – em 1985 tem início o projeto Escola de Espectador, que oferece convites a estudantes de escolas públicas e integrantes de associações de Juiz de Fora e região, o que contribui para a formação e a diversificação do público de teatro.

Peça “Os ossos do barão”, em 1999 (Foto: Divulgação)

Outras ações extensionistas são o Centro de Estudos Teatrais – Cursos e Oficinas, que promove uma iniciação à arte teatral, com disciplinas de formação cultural e técnica. Em 1994, é criado o Workshop de Interpretação para a Terceira Idade, cuja metodologia é descrita na Cartografia do Teatro Brasileiro.

Na avaliação da pró-reitora de Extensão, Ana Lívia Coimbra, os projetos de José Luiz Ribeiro consolidaram os princípios da Universidade: ensino, pesquisa e extensão. Como aponta a pró-reitora, em meio a essas atividades, estudantes trilharam o caminho para a docência; espectadores viraram alunos da UFJF e trabalhos de pesquisa foram realizados a partir das atividades desenvolvidas nos projetos de Extensão.

“É uma vida inteira dedicada à Universidade e às artes. E um exemplo que foi seguido por muitos, inclusive por mim, que fui sua aluna na Faculdade de Serviço Social nos anos 1980. É uma alegria a notícia desse reconhecimento; uma honraria a todo um trabalho desenvolvido dentro da Universidade Federal de Juiz de Fora, para a sociedade, que teve acesso ao que de mais bonito a Universidade pode oferecer”, considera Ana Lívia.

A diretora do Forum da Cultura, Marise Mendes, também destaca as ações extensionistas que José Luiz promove por meio do Divulgação. “No Forum, onde já apresentou por volta de 250 montagens, ele realiza importantes projetos de extensão junto à Facom, como o Escola de Espectador, viabilizando acesso ao teatro para comunidades e escolas de periferia; o Workshop de Interpretação para a Terceira Idade, com produções voltadas para esse núcleo; e o Centro de Estudos Teatrais, com cursos e oficinas voltados para adolescentes e universitários.”

Opção por Juiz de Fora

Peça “O doente imaginário”, em 2013 (Foto: Jesualdo Castro)

Surpreso com a honraria, José Luiz reafirma a opção por fazer teatro em sua terra natal. A permanência em Juiz de Fora não se deu por falta de convites: para ir trabalhar em Portugal, por exemplo. O artista chegou a dirigir espetáculos em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro, onde também fez participações como ator em telenovelas – mas sempre voltou para a aldeia.

“O repertório que eu abordei, a quantidade de peças que a gente escreveu espelhando o tempo, eu só tive porque optei por ter um teatro de grupo. Acreditava que existe uma questão pedagógica em fazer um teatro de grupo, como faz o Galpão (companhia teatral fundada em BH em 1982); eles estão juntos durante muito tempo e a gente vê que existe um aprendizado. Não importa quantas batalhas eu ganhei, o importante é que eu fui fiel à minha causa”.

 

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